
Alvaro Costa e Silva
Folha
Já lá se vão mais de 600 dias, mas você há de lembrar. Logo depois dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do seu motorista Anderson Gomes, a desembargadora Marília de Castro Neves Vieira, do Tribunal de Justiça do Rio, escreveu no Facebook que Marielle havia sido eleita pelo Comando Vermelho, a facção de criminosos. Da postagem caluniosa, fez parte a seguinte frase: “A verdade é que jamais saberemos ao certo o que determinou a morte da vereadora, mas temos certeza de que seu comportamento, ditado pelo seu engajamento político, foi determinante para seu trágico fim”.
Ao expressar a certeza, imediatamente após o fato, de que a morte jamais seria esclarecida, a desembargadora mostrava a vontade consciente de uma parte da sociedade —o caso deveria ser enterrado.
CASO ENCERRADO – Até agora, a atuação da polícia e do Ministério Público parece articular a mesma verdade — o caso deve ser enterrado. A maneira pela qual as investigações têm sido conduzidas envergonharia o inspetor Clouseau, interpretado por Peter Sellers na série de filmes “A Pantera Cor de Rosa”. A diferença é que Clouseau, no fim de suas trapalhadas, sempre desvenda o crime.
O ex-policial Ronnie Lessa e o comparsa Élcio de Queiroz foram presos em março de 2019, acusados pelas mortes. A polícia descobriu que, no dia fatídico, Queiroz esteve no condomínio Vivendas, na Barra da Tijuca, e disse ao porteiro que iria à casa 58, onde morava o então deputado federal Jair Bolsonaro — mas só descobriu isso um ano depois do atentado.
CAROÇO NO ANGU – Entre muitas outras dúvidas, cabe perguntar ao Ministério Público por que tanta demora em analisar os áudios da portaria e por que uma foto do livro de visitas do condomínio foi parar no celular de Lessa, o matador de aluguel.
Antiga expressão popular tem sido ouvida, lida e comentada com frequência nos últimos dias: tem caroço nesse angu.