Os atos aprovados e anulados pela Assembleia Legislativa
Se algum diretor de cinema se aventurasse, por uma razão qualquer, a fazer um filme sobre a política do Piauí, no gênero faroeste, aquele com mocinho e bandido, não iria conseguir. Para o elenco desse tipo de filme, por aqui só existem heróis, aqueles que na época de ouro dessas películas muitos de nós chamávamos de ar-tis-tas.
Veja só este arremedo de roteiro baseado em fatos reais: o governador Wellington Dias, o artista principal, sabe mais que todo mundo que em janeiro de cada ano, faça chuva ou faça sol, entra em vigor o valor do novo piso nacional do magistério. Isso vem desde 2008.
Sabendo que o governador sabe disso, mas às vezes faz questão de esquecer, as lideranças do magistério avisaram logo no começo do ano: os professores só entrariam em sala de aula, para dar início ao ano letivo de 2018, com o novo piso na conta-salário.
Índio sabido
O governador usou, então, a sua lábia de “índio mais sabido do Brasil”, nas palavras do ex-presidente Lula. Alegou que o Estado havia ultrapassado o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal, etc. e tal e mais isso e mais aquilo e acabou convencendo as lideranças do magistério que só poderia pagar o piso de duas vezes, uma em maio e a outra em setembro. Isso foi já em março.
Acordo fechado, o projeto de lei foi encaminhado pelo governo à Assembleia Legislativa. O reajuste salarial do magistério, de 6,81%, foi aprovado por unanimidade, pois nenhum parlamentar iria se arriscar a se queimar com os professores.
Quando o projeto chegou às mãos do governador para sanção, descobriu-se que o prazo para concessão de reajuste salarial já havia passado. Ele acabara em 10 de abril. A partir daí, começava o período proibitivo e conceder aumento salarial seria incorrer em crime eleitoral e tornar-se inelegível.
Governador veta sua lei
O governador decidiu, então, vetar uma lei proposta por ele mesmo. E devolveu o calhamaço para a Assembleia Legislativa, para que a Casa apreciasse seu veto: “Toma, que o filho é teu!”.
A Assembleia, dando uma de independente, mas na verdade de comum acordo com o governo, derrubou o veto governamental, para que fizesse valer a lei aprovada por ela e fosse assegurado o reajuste do piso do magistério.
“Quem ama, não mata!”
Ocorre que, na hora da promulgação da lei, o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Themístocles Filho (MDB), outro cacique da tribo passado na casca do alho, saltou bem acolá: “Assino, não! Quem ama não mata!”
E mais não disse, porque não precisava. Em outras palavras, ele avisava: se o governador não pode sancionar porque é candidato, ele também não poderia, pois também vai concorrer às eleições deste ano. Ou seja, ele mesmo era que não iria ficar com essa batata quente nas mãos.
Os demais membros da Mesa Diretora – no total de oito – também tiraram o corpo de banda. Ninguém mais quis assinar a lei, nem o vice-presidente, deputado Luciano Nunes (PSDB), pré-candidato a governador pela oposição. Todos temiam ser alcançados pela inelegibilidade.
A deputada Juliana Falcão (PSDB), mesmo sendo a única que não será candidata nas próximas eleições, preferiu renunciar ao cargo de 4º. Secretária da Mesa a assinar o ato.
Mais sabedoria
Mas era preciso publicar a decisão, para que ela ganhasse força de lei. Resultado: o Decreto Legislativo derrubando o veto do governador e garantindo o novo piso do professor foi publicado no Diário Oficial do Estado sem assinatura. O ato saiu na edição do dia 14.
Além do Decreto Legislativo, saiu na mesma página do Diário Oficial um decreto do governador regulamentando o ato da Assembleia.
O governador, mostrando mais uma vez que não é menino, fixou em seu decreto o reajuste do professor em 2,95% , ou seja, menor que o aprovado anteriormente pela Assembleia e correspondente à inflação do período.
Anula tudo!
Quando se deram conta que a emenda havia saído pior que o soneto, governo e Assembleia decidiram por uma nova votação para ressuscitar o veto do governador e anular o aumento.
Alegaram que o Decreto Legislativo derrubando o veto fora publicado sem assinatura e que houve ainda outra falha: veto do governador não pode ser derrubado nem mantido em votação fechada, secreta, mas aberta.
Houve tumulto em sessão na Assembleia legislativa
Daí a celeuma ocorrida durante a semana para anular todos os atos relativos ao aumento de 6,81% e a concessão de um novo reajuste, de 2,95%, correspondente à reposição da inflação do período, na avaliação de todos permitida pela lei.
Dramalhão
Agora, os professores que entrem na justiça para cobrar a diferença. O governo está disposto a pagá-la, desde que esteja com uma ordem judicial em mãos.
Moral da história: na política do Piauí só tem artista. Se o governo tivesse dado o reajuste do piso do professor na época certa, como fizeram as Prefeituras de Teresina, de Parnaíba, de Morro Cabeça do Tempo, de Caxingó e de tantos outros municípios, todo esse dramalhão não estaria em cartaz.
Fonte: Coluna de Zózimo Tavares