Por Rômulo Rocha – Do Blog Bastidores
INSTITUTO DO VAQUEIRO E AS EMENDAS ‘SEM RUMO’ DE DEPUTADOS
– A DFAE (órgão técnico do TCE) relatou que de três convênios analisados com essa instituição, mais de 95% dos recursos seriam ‘destinados’ para serviços prestados por terceiros, o que demonstra que não possuía suporte
– A Fundação FCCAMC é um exemplo de que o trabalho social tem sido desvirtuado em benefícios dos próprios agentes políticos e privados
– Veja que deputados são responsáveis pelas emendas alvo do TCE
– Em São Raimundo Nonato um exemplo do suposto descaso para com o dinheiro público
“EH, VIDA DE GADO, POVO MARCADO, POVO FELIZ”
É sabido que, por vezes, o repasse de emendas de deputados no Piauí se tornou, para muitos uma oportunidade de angariar esses recursos e fortalecer suas respectivas associações sob o manto de que irão prestar serviços para a comunidade carente do estado.
Daí então os deputados estaduais destinam emendas para uma determinada pasta, vem uma entidade (pode ser recém criada, porque serve também), apresenta um projeto para obter os recursos dessas emendas e… o dinheiro ganha outros destinos e não aquele previsto no plano de trabalho (se é que existe um plano de trabalho). E se os recursos ganham o destino do plano de trabalho, não são investidos em sua totalidade. Esse é o jogo jogado.
Pois bem, os órgãos de controle, no entanto, estão atentos a essas movimentações. Recentemente um dos institutos suspeitos na realização dessa prática foi alvo de tomada de contas especial determinada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PI), por não ter comprovado a contento a aplicação de cerca de R$ 2,2 milhões.
Trata-se do Instituto Cultural do Vaqueiro Piauiense (ICVP), cujo presidente é Daniel Napoleão do Rêgo Alencar. Ele é suspeito – junto com outras empresas privadas, de não aplicar a dinheirama recebida conforme se comprometeu a fazer.
As empresas que deram suporte são a Gleidiane Barros Tavares – ME, F. I. Bezerra Júnior – ME, Makete Publicidade LTDA –ME, Agenda Eventos e Publicidade LTDA –ME e Evidence Eventos LTDA.
RECURSOS SÃO ORIUNDOS DE EMENDAS DE DEPUTADOS
Os recursos públicos destinados para os convênios 106/2015, 107/2015 e 132/2015 são oriundos de emendas parlamentares de autoria de deputados como Antônio Félix, Liziê Coelho e Margareth Coêlho. As emendas foram destinadas à Secretaria de Saúde, que à época era comandada pelo então secretário Francisco Costa, também alvo da tomada de contas especial.
Nos projetos apresentados pelo ICVP o apelo era exemplar. Tais convênios permitiriam, veja só, “realizar projeto que discute, incentiva e promove a melhoria da qualidade de vida e da população do campo, a ser realizado em comunidades rurais dos municípios de Acauã, Sigefredo Pacheco, Nazaré do Piauí, São Félix, Jatobá, Paulistana e Queimada Nova”.
Só com esses fins foram destinados R$ 1,6 milhão, segundo apontam documentos oficiais da Secretaria de Saúde.
Outro montante de R$ 584 mil foi destinado para a “realização de palestras, e encontros com jovens do campo sobre prevenção e riscos de contaminação pelo HIV e outras DSTs”, e que deveria beneficiar cinco municípios da Região dos Cocais: Barras, Batalha, Brasileira, Campo Largo do Piauí e Esperantina”.
UM EXEMPLO DE MÁ APLICAÇÃO: SÃO RAIMUNDO NONATO
Anos depois o que se viu foi um verdadeiro descalabro constatado por técnicos do TCE quando foram verificar a aplicação do dinheiro in loco.
Um dos exemplos é São Raimundo Nonato.
“(…) Consta no relatório preliminar que em São Raimundo Nonato, nem tentativa de contato com os órgãos locais o ICVP realizou, mesmo com cronograma de execução protocolado nesta Corte de Contas”.
E quando realizado o tal contato houve “recrutamento às pressas” de profissionais tendo em vista a ida in loco de técnicos do TCE. Além do mais as ações foram destinadas ao público urbano e não ao do campo, como previsto no projeto inicial. Tudo muito suspeito.
“ (…) Exames como de detecção de glaucoma, daltonismo e acuidade visual e palestra sobre tabagismo não foram realizados”, detectaram.
“A DFAE observou [ainda] que a defesa não acostou aos autos documentos que comprovem a efetividade das ações em São Raimundo Nonato. Observou ainda que apesar de ser um município populoso, a quantidade de atendimentos em São Raimundo Nonato foi irrisória”, trouxe o voto do conselheiro relator Kléber Dantas Eulálio, que foi seguido por seus pares de forma unânime, quando da determinação para a realização de tomada de contas especial nos três convênios sob intensas suspeitas.
Só de tendas e estandes foram gastos 240 mil, ou seja, mais de 10% do valor destinado a atividades para a população pobre rural, o que para o Tribunal de Contas trata-se de “sobrepreço”. “A DFAE informou também foram feitos pagamentos de locação de transporte de equipe e material no valor de R$ 120.000,00, o que se percebe que tais despesas foram cobradas separadamente e que não haveria necessidade do aumento no valor pago nas locações das tendas e estandes”, traz o voto do relator.
“Pagamento de R$ 135.000,00 a título de confecção de cartilhas, no entanto, apesar de solicitado, não foi apresentado nenhum material gráfico distribuído na realização dos eventos. Em inspeção in loco, observou-se que as cartilhas não foram distribuídas”, acresce.
_Trecho de relatório de inspeção em São Raimundo Nonato
E por aí vai. Some-se a isso a ausência de notas fiscais.
TENTATIVA DE BARRAR TOMADA DE CONTAS ESPECIAL
Ano passado, o presidente do Instituto Cultural do Vaqueiro Piauiense, Daniel Napoleão do Rêgo Alencar, ainda chegou a apresentar petição recursal junto ao Tribunal de Contas pleiteando a anulação da tomada de contas especial.
Argumentava o empresário que “aquela época caberia à Secretaria de Saúde do Estado do Piauí informar a este Tribunal que a prestação de contas do Convênio, 132/2015 já havia sido finalizada e aprovada, conforme prova certidões de aprovação já anexas ao presente processo”. Ou seja, a Secretaria de Saúde, sob a gestão do secretário Francisco Costa aprovou os ‘achados’ da Corte de Contas.
À unanimidade, o TCE não reconheceu do recurso.
FCCAMC
O modo como o Instituto do Vaqueiro foi contratado pela pasta da Saúde é semelhante à como a FCCAMC foi tempos atrás e para serviços afins, fáceis de serem dados como realizados e com as mesmas tais emendas de deputados estaduais.
A FCCAMC era uma enrolada instituição que enfrentou jornalistas responsáveis por expor seus supostos malfeitos. A fundação usou inclusive contrainformação na imprensa paga.
O seu presidente, que se dizia muito influente no meio político e tinha a porta aberta em muitos gabinetes de homens públicos, veio a falecer no ano passado.
Não há notícias de que em seu velório compareceram autoridades.