O governador Rafael Fonteles (PT), através da Procuradoria-Geral do Estado do Piauí, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender uma liminar do Tribunal de Justiça que proibiu a cobrança de ICMS sobre energia solar excedente compensada no Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE).
A ação foi ajuizada na noite desta segunda-feira, dia 22 de dezembro, às vésperas do Natal. Passará a ser analisada pelo ministro Edson Fachin, presidente do STF.

A decisão judicial que suspendeu a cobrança do ICMS foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Progressistas-PI, reconhecendo que não há circulação jurídica de mercadoria quando o consumidor injeta energia na rede e depois a compensa — portanto, não há fato gerador do imposto. A resposta do governo estadual foi imediata: alegar “grave lesão à economia pública” e pedir a suspensão da medida que, na prática, protege consumidores que investiram em energia renovável.
O argumento central do Estado é financeiro: a perda de arrecadação superaria R$ 31 milhões anuais, comprometendo o pagamento de servidores e o equilíbrio fiscal. Soma-se a isso a impossibilidade de cobrar R$ 144 milhões em autos de infração já lavrados contra a distribuidora Equatorial Piauí. O discurso é dramático: fala-se em “periculum in mora inverso”, em risco ao pagamento do 13º salário, em colapso das finanças públicas. Mas o que não se menciona é que o Estado sempre concedeu isenção parcial do ICMS sobre energia solar, conforme o Convênio ICMS 16/2015. A diferença é que agora a decisão judicial ampliou essa proteção, impedindo a cobrança sobre componentes tarifários que o fisco insistia em tributar — e que, segundo o TJPI, não configuram operação mercantil.
O pedido ao STF revela uma engenharia argumentativa sofisticada, mas frágil. O Estado alega que o ICMS não incide sobre a energia gerada pelo consumidor, mas sim sobre a energia “efetivamente consumida” da rede. Ocorre que, no sistema de compensação, o consumidor injeta energia excedente e depois a recebe de volta, em um mecanismo que a própria Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Lei Federal 14.300/2022 definem como “empréstimo gratuito”. Não há compra, não há venda, não há transferência de titularidade. O Estado, no entanto, insiste em tributar esse fluxo, alegando que a distribuidora é a contribuinte do imposto e que a circulação ocorre quando a energia passa pelo medidor. É uma interpretação que ignora a natureza jurídica do sistema de compensação e transforma um mecanismo de incentivo à energia renovável em fonte de arrecadação. (Guilherme Freire)